A,oral do homem platônico é uma moral sobretudo política. Este tipo de concepção de Platão se deu devido o fato de sua juventude ter sido marcada pelo Fenômeno conhecido como "polís", ou seja, o homem para Platão é o cidadão, que vive e participa da sociedade política.
Portanto a política sempre ocupar[a um lugar de destaque na vida do filósofo: "... passei por experiência comum a muitos e me decidi firmemente a uma coisa: apenas em condição de dispor da minha vontade, logo dedicar-me à vida política"
O contexto em que viveu Platão foi um contexto onde a corrupção, não somente na cidade de Atenas, mas em todas as cidades do mundo grego. Este tipo de corrupção a liado a uma injustiça crescente da vida política de Atenas, contribuíram para que Platão fomentasse dentro de si o desejo de propor uma nova forma e concepção política, onde a justa medida, governasse a vida de todos os cidadão da pólis.
O estopim para o caminho do amadurecimento político da filosofia de Platão, se deu sem dúvida nenhuma, após o episódio da morte de seu mestre Sócrates. Este fato coloca Platão diante de um dilema, se os governantes mataram aquele que era o mais justo, ou pelo menos aquele que possuía um diferencial significativa em relação aos outros cidadão, quem então poderá ser considerado um administrador dignos e que não seja corrupto?
Platão começa a pesquisar e observar as ações das pessoas no cenário político, evidenciando assim, todo o quadro de complexidade que envolve a administração da pólis.
O caminho que o filósofo encontra para mudança da concepção política de sua época, é a reformulação de todas as constituições e legislações que regiam a própria pólis. Desta maneira Platão não pretendia curar a doença da corrupção e da injustiça, através de medicações paliativas, mas pretendia solucionar o problema em sua origem, propondo uma nova base para todo o assentamento político que os novos governadores teriam de trabalhar.
O caminho que Platão colocará para um reta orientação da administração da pólis, através de um meio mais justo e que não exista a corrupção, é o caminho da filosofia, isto é, a filosofia possibilitará que o administrador público seja mais coerente com suas ações e possa se orientar por uma norma que o guie tranqüilamente pela tumultuada vida política.
Os únicos em condições para assumir o poder para Platão são os filósofos, pois estes, são os únicos capazes de entender e se guiar pela justa medida, desta maneira o que se coloca para o administrador acima de tudo é a sapiência, este munido dos recursos que a filosofia
A nova política platônica e o novo Estado deverão ter seu instrumento na filosofia, porque ela representa o único caminho seguro de acesso aos valores de justiça e de bem, que são o fundamento verdadeiro de toda política autêntica e, portanto, do verdadeiro Estado.
A teoria do Estado Platônico tem seguido ou o caminho utópico da descrição do Estado perfeito, ou aquele mais realista das maneiras e dos caminhos para melhorar a forma do Estado.
Platão por isso, em Górgias não hesita e põe na boca de Sócrates este desafio:- "Eu creio que estou entre os poucos atenienses, para não dizer o único, que tentam a verdadeira arte política, e o único entre os que agora vivem, que a exercita"
Platão estava convicto de que o Verdadeiro e o Bem contemplados devessem descer à realidade com o fim de torná-la melhor, devessem tornar-se politicamente efetiva.
Para ele, toda forma de política que pretenda ser autêntica deve ter em vista o bem do cidadão; mas, é preciso saber que o verdadeiro bem do homem é o Bem Espiritual. Enquanto o corpo é apenas seu casulo passageiro e fenomênico.
É nesta base que se diferencia a política verdadeira da falsa: a verdadeira política deve ter em vista o cuidado da alma (verdadeiro homem), enquanto a falsa tem em vista o corpo, o prazer do corpo e tudo que é relativo à dimensão "inautêntica do homem". E o meio para curar a alma não é senão a filosofia, e por conseqüência, a identificação com política e a filosofia. Isto no contexto platônico, de político e filósofo.
Esta concepção da dicotomia de corpo e alma se evidencia através de sua teoria do mundo das idéias, pois segundo ela o ideal perfeito esta num mundo inacessível, devido a limitação que matéria impõe, enquanto que neste mundo a imperfeito, somente serve de cárcere da alma. Desta maneira devemos buscar nos assemelhar ao máximo possível deste mundo de perfeição, que é mundo das idéias.
Esta ilustração serve a nós para entender o porque na concepção política de Platão o filósofo será o único em condições de administrar bem a cidade, pois esmo que ele seja limitado pela matéria, que é o seu corpo ele será conduzido pela filosofia a uma aproximação mais efetiva da idéia de justiça, podendo desta maneira tratar mais justamente os problemas de todos os cidadão proporcionado assim, uma vida mais digna a todos os que habitam a pólis.
Estado e a lei do Estado, constituía todo o paradigma de toda forma de vida do indivíduo, portanto o que era importante para o homem grego era ser um cidadão, pois somente nesta condição a sua virtude de homem será capaz de se manifestar, pois ser cidadão implica na participação da pólis, desde a tomada de decisões até a forma pela qual eram estabelecidas as leis que regiam a mesma. Portando a participação da pólis não era horizonte relativo, mas sim o horizonte absoluto da vida do homem.
Transferindo para a nossa atualidade o realismo político de Platão vai colocar em destaque a inversão de um idealismo traçado pelo filósofa ateniense, pois, é inegável de se descartar que diferentemente da concepção política platônica o indivíduo e o cidadão não é mais a mesma pessoa. Na Grécia o indivíduo somente tinha razão de ser, caso ele fosse um cidadão, pois desta maneira ele, se faria participante e integrante da vida da pólis, ao passo que o indivíduo de hoje, pode deixar de participar da vida política da cidade e não ser colocada para ele a questão da sua importância no processo político. O Estado renunciou há muito à apropriação das esferas da vida interior dos cidadãos que interessavam a Platão acima de tudo, deixando à consciência dos indivíduos a livre decisão nesses assuntos.
Pode-se percebem que o pensamento político não mudou pois ele requer para o seu dinamismo uma participação seja de qualquer tipo de esfera, agora o modo de como se dá a importância para o cidadão que existia na pólis grega e o indivíduo que existe na modernidade são impares e não se encontra caminhos de restaurar novamente esta mesma dignidade a que o homem tem direito, ou seja não se pode deixar de levar em consideração que a participação da vida da pólis era o que dava significada a vida do homem no coletivo, e hoje esta participação não coloca este mesmo significado ma vida do indivíduo moderno.
Já no âmbito da concepção histórica de Platão, este, estava condicionado em dois sentidos: pelos pressupostos do seu sistema e por determinada visão histórico – social - cultural do Estado, nenhuma nem outra podem repetir-se historicamente. Entretanto, Platão nos alertou quanto a verdade que hoje serve como advertência: uma política que, ao regular a vida em sociedade dos homens, abdique das dimensões do espírito e estruture-se exclusivamente segundo as leis da dimensão material do homem, não poderá subsistir; as exigências do espírito, negadas ou reprimidas, cedo ou tarde, tornam-se a impor-se inexoravelmente.
Como já nos referimos antes, a ciência do político coincidia com o conhecimento supremo do Bem e das Idéias e, portanto, da filosofia.
Segundo Platão há dois modos de proceder na medida, que são dois critérios diversos. "Há a medida que tem como base a relação recíproca de grande -pequena, longo-curto, excesso-defeito, e é uma medida de caráter matemático. Há porém a medida segundo a essência que é necessária à geração" [17]. Ou seja, a medida que tem como base o justo meio ou a medida justa, a saber, as Idéias ou essências das coisas, e essa é uma medida que podemos chamar Axiológica, porque se refere a valores ideais (as qualidades) e não a puras quantidades. Este gênero de medida constitui, uma clara superação do pitagorismo, inteiramente análoga à que foi levada a cabo com relação ao eleatismo, com a introdução do "não-ser" como "diverso".
O justo meio para Platão, ou melhor dizendo, a justa medida, é oque colocará na administração da pólis a noção do que deve ser melhor oferecido para os cidadão, isto é, ela dará ao filósofo administrador o conhecimento capaz de evitar a injustiça e a corrupção, pois uma vez que o administrador, é um filósofo, que possui o instrumental da filosofia, este será guiado pela ética para o estabelecimento de valores que estarão dispostos da mesma maneira que as idéias em seu mundo, portanto estarão disposta segundo uma hierarquia de valores dos mais elevados decrescendo até os menos elevados que poderão orientar o melhor caminho para a realização plena da pólis e dos cidadãos.
Para se ter um conhecimento mais eficaz da justa medida que o administrador deve ter, O filósofo ateniense diz que a vida política é uma arte e ara então compreendemos melhor a vida política, demos compreender melhor do que se trata esta arte. Platão coloca para nós o exemplo da arte, pode ser dividida em duas partes: de um lado colocando todas as Artes que medem o número, o comprimento, a largura, a profundidade, a espessura, com respeito aos seus contrários; do outro as que realizam essas medidas na sua relação com a medida justa, com o conveniente, com o que é oportuno, com o que é dever-ser, e com tudo que tende ao justo meio, fugindo dos extremos.
A distinção aplicada, em geral, a todas as artes e de modo específico à arte do político, diremos que ela tem como objeto o justo meio, o dever, o oportuno, o conveniente nas esferas mais importantes da vida da Cidade.
A atividade do político distingue-se perfeitamente, desse modo, de uma série de atividades conexas com a política, mas que, na realidade, mostram-se subsidiárias e subordinadas a ela. Assim a retórica se distingue da política porque, enquanto a primeira é atividade de persuasão, a segunda é atividade que decide se é ou não conveniente persuadir (ou usar a força) e por isso é diversa, mas superior.
O raciocínio análogo existe para a Arte da guerra, que se ocupa em fazer e vencer a guerra, mas não em decidir se é ou não conveniente fazer a guerra de preferência a manter a paz, decisão que depende justamente a política e também a atividade dos juizes diversa da política e a ela subordinada, porque a primeira se limita a aplicar a lei, enquanto a atividade do político estabelece a lei.
Mas o político busca a medida justa ou o justo meio sobretudo na atuação de sua tarefa fundamental que é construir a unidade do Estado partindo de elementos heterogêneos mesmo opostos, dando-lhes uma única força e impondo-lhes um único selo. Com efeito, os homens podem ser divididos segundo dois temperamentos e duas virtudes opostas: de um lado os mansos e temperantes, de outro os audazes, valorosos e fortes.
O político deve justamente saber harmonizar esses temperamentos opostos como se compusesse uma tela e um tecido usando fios macios e duros. Ao tecer essa tela, ele fixará a parte divina do homem (a alma) com um "nó" divino e a parte animal (o corpo), como um "nó" humano. O nó divino é o conhecimento dos valores supremos, que amansa as almas audazes e torna sensatas as almas mansas e une as outras com relação ao belo e ao bom numa só opinião.
O nó humano, por sua vez consiste em fazer com que, por meio de matrimônios oportunamente combinados, as naturezas opostas se conjuguem, de modo que os temperamentos opostos venham a se equilibrar também do ponto de vista biológico.
Portanto, para Sócrates e Platão, não há distinção entre ética e política, porque é evidente a relação entre a ética e a ciência do Estado. E o homem para Platão só pode explicar-se moralmente se explicar-se politicamente.
Por fim, Platão quando se refere a justa medida, fala que ela domina as leis, revela seu fundamento de caráter "teológico" afirmando que, a medida de todas as coisas é Deus.
O poder político constitui a substância da própria Filosofia Platônica. Platão buscou desde cedo as causas da corrupção dos homens de governo, seus costumes e as leis. Percebeu assim que não só Atenas, mas todas as cidades sofriam em razão de maus governos. Com efeito, sentindo a necessidade de reformas, louvou a reta filosofia e constatou que somente à luz dela é possível esperar ver justa a política das cidades e justa a vida dos cidadãos.
As injustiças e desventuras humanas não conhecerão fim a não ser no dia em que verdadeiros e puros filósofos terão acesso ao poder, no dia em que por algum "dom de Deus", as classes dirigentes nas várias cidades sejam inflamadas pelo verdadeiro amor da sapiência, e sejam formados por filósofos. Era o objetivo desejado por Platão.
O novo Estado Platônico tem seu instrumento na Filosofia, porque ela representa o único caminho seguro de acesso aos valores de justiça e de bem, fundamento verdadeiro de toda política autêntica e, portanto, do verdadeiro Estado.
No Estado idealizado por Platão, torna-se de máxima importância a seleção de jovens dotados de autêntica natureza filosófica (isto é, de jovens nos quais a parte racional da alma domina sobre as outras duas) e a sua educação. Podemos dizer que a paideia ginástico-musical produz os efeitos do Bem, mas não o conhecimento do Bem. É esta, portanto, a meta da educação filosófica: "alcançar o máximo", a posse do Bem em sina ordem do conhecimento. Para chegar a este conhecimento, requer-se longo tempo para percorrer o caminho do sensível ao supra-sensível, do corruptível ao incorruptível, do devir ao ser. O trecho mais longo e árduo deste caminho é constituído pela dialética, com a qual a alma atinge o puro ser das Idéias, e, através deste, chega à visão do Bem, ao "conhecimento máximo".
De fato, o método e o conteúdo da paidéia dos governantes e dirigentes do Estado são exatamente o método e o conteúdo da filosofia platônica. Todos os outros meios de conhecimento e ciências serão "aplicados" de acordo com cada classe para a melhor educação e ordenamento dos membros do Estado.
Platão sabia que todo ensinamento e educação deve ser proposto, não imposto, pois na alma não poderá existir nenhum ensinamento forçado. Porque para ele os meninos não deveriam ser educados com a violência, mas com os jogos. A prova maior da aptidão ou inaptidão de um jovem à dialética se dava deste modo: quem sabe ver o conjunto é dialético, quem não sabe, não o é. Esta é sua natureza, ver o todo, o conjunto inteiro[18].
Somente aos 50 anos, depois de ter passado por todas as provas na educação dialética e empírica é que termina, segundo Platão, a paidéia dos governantes: depois disto o papel era se dedicar à filosofia a maior parte do tempo, assumir o governo para o bem da comunidade, pois é necessário, por último, formar continuamente outros cidadãos a seu exemplo para governar e Estado.
Quanto à educação das mulheres e homens, bem como dos guardiões e guerreiros, Platão não faz distinção, pois tendo dotes iguais, devem receber a mesma educação e exercer as mesmas funções no Estado. Isto também é válido para a classe dos governantes. A maior valorização no que diz respeito a mulher da Antigüidade foi feita por Platão.
No Estado não pode haver privilégio de classes, mas deve-se fazer com que as classes se proporcionem vantagens recíprocas segundo a sua capacidade. O supremo "poder político" na visão platônica torna-se, pois, o supremo e necessário "serviço" daquele que, tendo contemplado o Bem, o faz descer a realidade e, através da práxis política, o distribui aos outros.
A obra República pode estar na contribuição entre ética e política. Seu objetivo é a 'justiça' ou o 'Estado Ideal'? Do ponto de vista de Sócrates e Platão, não há distinção, a não ser por simples conveniência, entre moral e política. As leis do direito são as mesmas para as classes e para os indivíduos. Mas deve-se acrescentar que essas leis são, antes de tudo, leis de moral pessoal: assim se considera que a política está fundada sobre a ética, não a ética sobre a política.
O Estado Ideal para Platão é justamente como a ampliação da alma. Esse Estado platônico não é senão a imagem aumentada do homem: formar o verdadeiro Estado significa, para Platão, formar o verdadeiro homem. Isto é política platônica[19].
Para Karl Popper, em sua obra: A sociedade aberta e seus inimigos, o Estado Platônico seria, em suma, a negação da liberdade. Platão seria o inimigo da sociedade democrática e da democracia. Isto para salientar que a concepção de Estado Platônico, como afirma Popper, é qualificada como conservadora e reacionária, bem como acentuadamente totalitária. Contudo, pode-se dizer que em função das categorias próprias das ideologias políticas modernas atuais. Pois o discurso autêntico político de Platão, é sobretudo, Filosofia, metafísica e até escatologia do Estado. Embora alguns considerem ideologia. De fato, tais equívocos são relevantes no terreno da discussão filosófica, porém, o que Platão pretendeu foi conhecer e formar o Estado perfeito (Ideal) para conhecer e formar o homem perfeito.
Na República, Platão leva o Estado às últimas conseqüências: O Estado é a alma ampliada, e entre a alma e o Estado há uma correlação recíproca. A sede autêntica do verdadeiro Estado e da verdadeira política é justamente a alma.
Segundo Platão, o Estado nasce de nossa necessidade. Como as necessidades são múltiplas, cada pessoa necessita de muitos outros homens que atendam a essas necessidades. Tendo em vista a satisfação das necessidades essenciais da vida, tem igualmente necessidade de uma classe de guardiões e guerreiros. O Estado deve ter tudo que corresponde a sua formação e segurança. Os guardiões deve ser dotados de mansidão e de ousadia; devem ser fortes e ágeis no físico, irascíveis, valentes e amantes do saber na alma. Para estes é necessária uma educação muito apurada. A cultura (poesia e música) e a ginástica serão os instrumentos mais idôneos para educar o corpo e a alma do guardião.
O pensamento platônico reformula a paidéia helênica. A poesia da qual se alimentará a alma dos jovens no Estado perfeito deverá ser purificada de tudo quanto é moralmente indecente e indecoroso, e de tudo quanto é falso, sobretudo no que diz respeito às narrações em torno dos deuses. Tanto na questão da música quanto da ginástica deve, assim, ser em ritmos apropriados e simples para a música e apropriada e simples para a ginástica para não cair em nenhuma forma de excesso. Ela deve acompanhar a educação da alma, que voa pode tornar bom o corpo, mas não vice-versa. Toda educação deve, portanto, servir para produzir no homem acordo e harmonia perfeita. Dentre os guardiões haverá aqueles que deverão "obedecer" e aqueles que deverão "mandar". Estes últimos, são os dirigentes do Estado, pois mais que os outros amam a Cidade, ao longo da vida, realizando com zelo o que é útil e bom (estes são os filósofos verdadeiros, terceira classe...). Entretanto, é preciso ter em mente que em Platão a divisão de classe ainda não estava completa. As três classes sociais constituem abertura moderada. No fundamento das classes está a índole humana, cada classe com a índole que melhor corresponde com a sua.
À primeira classe, formada por camponeses, artesãos e comerciantes, é concedida a posse de bens e riquezas "moderadas". Aos defensores do Estado não será concedida nenhuma posse de bens e riquezas; terão habitação e mesa comuns, e receberão víveres da parte dos outros cidadãos como compensação pela sua atividade. Isto para a felicidade do Estado: entretanto não é só uma classe que deverá ser feliz no Estado perfeito já que, tendo equilibrada felicidade do Estado na sua integralidade, cada classe deve participar da felicidade somente na medida em que a sua natureza permite.
Os guardiães devem, como definiu Platão, vigiar quanto ao equilíbrio do Estado, para que na primeira classe não penetre nem demasiada riqueza nem demasiada pobreza, bem como para que o Estado não se torne demasiado grande nem demasiado pequeno. Isto tem em vista o cuidado quanto a índole e a natureza dos indivíduos para que correspondam as funções que exercem e que se proceda adequada à educação dos melhores jovens. Não se devem mudar com isso as leis que as regem, nem o ordenamento do Estado.
O Estado ideal é delineado, mostrando a natureza e o valor da justiça; para isto, Platão descreve as virtudes cardeais, isto é, além da justiça, a sapiência, a fortaleza e a temperança. O Estado perfeito deve possuir as quatro virtudes fundamentais. O Estado é sábio pela classe dos seus governantes. A fortaleza é a virtude própria sobretudo dos guerreiros e o Estado é forte pela classe dos seus guerreiros. O Estado temperante é aquele no qual os mais fracos estão de acordo com os mais fortes e os inferiores em plena harmonia com os superiores. Quanto a justiça, percebe-se quando cada cidadão e cada classe atende às próprias funções do melhor modo, então a vida do Estado se desenrola de maneira perfeita e temos exatamente o Estado justo.
Como foi dito anteriormente, o Estado não é senão a ampliação do homem e da sua alma. Deste modo Platão diz: "- Penso que diremos também, Glauco, que o homem é justo do mesmo modo que a cidade é justa" As três classes sociais do Estado deverão corresponder a três formas ou faculdades na alma: a racional, a irascível e a apetitiva. Caberá à parte racional mandar. Assim, Estado feliz é somente aquele que cumpre ordenadamente as suas funções segundo a justiça e as outras virtudes.
O princípio de que a classe dos guardiães do Estado deve ter todas as coisas em comum: além da habitação e da mesa, também as mulheres, os filhos, a criação e a educação da prole, era mesmo revolucionário para os padrões do sistema da época. Tanto no que tange ao papel da mulher como do homem, dentro e fora das funções do Estado. Para não dizer que a concepção de leis que regem o Estado platônico eram autoritária nos termos que se definem hoje em dia, penso que ao invés de autoritário como diz Karl Popper, era mais uma forma rigorosa e nova de um novo Estado como queria Platão.
No que se refere a família, posta também em comum, os guardiões de nada mais poderão dizer "é meu", porque tudo absolutamente será comum, à exceção do corpo. É nesta definição que pode-se perceber o "comunismo platônico". Assim define Platão: "- Ao contrário, no Estado em que o maior número de cidadãos, a respeito da mesma coisa e segundo o mesmo sentido diz justamente é "meu" e "não é meu", "não haverá legítimo governo? - Sim, ótimo" Levando-se em conta estas afirmações, é evidente que o "comunismo" platônico não se aplica ao "coletivismo moderno", seja em razões históricas ou teóricas.
Quanto as disposições teóricas, os guardiões da cidade platônica, estão mais na posição de uma burocracia coletivista. O motivo da proibição de toda posse individual, mesmo da posse de uma mulher, combina-se com o princípio da seleção racial no conduzir à teoria da comunidade de mulheres e filhos para os guerreiros. No fundo Platão visava a uma grande família, para unificar a Cidade, cortando pela raiz tudo o que fomenta os egoísmos humanos.
Convém, no entanto, admitir que Platão não tinha "bem claro" o conceito de homem como indivíduo singular, único e irrepetível, usando termos atuais. Acima deste conceito, valia para ele mais a raça que o indivíduo, mais a coletividade que o sujeito singular.
O Estado ideal descrito por Platão é uma "aristocracia" no sentido mais forte e significativo do termo, vale dizer um Estado guardado e governado pelos "melhores" por natureza e por educação, fundado sobre a virtude como valor supremo e caracterizado pela primazia, nos seus cidadãos, da parte racional da alma. O Estado ideal e o homem régio ou aristocrata que lhe corresponde são caracterizados pelo domínio inconstante da racionalidade, virtude e liberdade, estes são os chefes do Estado. E igualmente na classe dos guardiões-guerreiros, na medida em que regula a alma irascível nela produzindo a virtude e coragem, e na classe inferior na medida em que regula a alma concupiscível nela produzindo temperança. Esse é o Estado são e, como tal feliz.
A felicidade superior do homem que vive segundo a política do Estado perfeito, isto é, vive a vida filosófica. A felicidade não pode consistir senão na forma mais alta do prazer, que é o da parte racional da alma. É o prazer mais verdadeiro. A vida política neste Estado garante a felicidade no aquém como no além, na vida depois da morte, para sempre. Para Platão a "verdadeira política" é aquela que não nos salva apenas no tempo, mas no eterno e para o eterno.
A República platônica exprime fundamentalmente um ideal realizável (mesmo historicamente o Estado perfeito não existe) no interior do homem, vale dizer, na sua alma. Se o Estado perfeito não existe fora de nós, podemos, no entanto, construi-lo em nós mesmos, seguindo a política verdadeira no nosso íntimo. Para Jaeger: "a essência do Estado de Platão não está na estrutura externa - dado que possua uma - mas no seu núcleo metafísico, na idéia de realidade absoluta e de valor sobre o qual é construído. Não é possível realizar a república de Platão imitando a sua organização externa, mas somente cumprindo a lei do bem absoluto que constitui a sua alma"
É natural que, no Estado histórico, o cidadão que vive a política da cidade ideal, tone-se estranho e tanto mais estranho quanto mais a sua vida se conforma com a política ideal. É daqui que surge a idéia, em Platão, do cidadão das duas Cidades, a Terrestre e a Divina, portanto um dualismo.